um ano a fazer parar o trânsito

Faz hoje um ano que uma nova bicicleta entrou na minha vida. A bem da verdade, já a conhecia de qualquer lado. Os alumínios, o selim, as malas… o quadro é que era outro! O aço gasto da velha Cósmica havia cedido ao meu encontro imediato com o pára-choques de um carro, vai daí não foi ao criador que lhe encomendei a alma mas à confiança do meu amigo xôr Machado, artesão que faz das biclas coração, a quem entreguei uma Cosmos partida em duas para me devolver uma iNBiCLA inteira. E foi pegando na expressão popular que significa transformar as adversidades em forças, que lhe dei o nome e o mote: fazer da Tripas coração.

Para minha alegria, o ajuste global não poderia ser melhor. Posso dizer, e disse-lhe, que o resultado saiu bem melhor que a encomenda. Se o conjunto quadro e forqueta estavam originalmente destinados a um outro projecto, depois de montar a noviça parecia que a bina havia sido feita mesmo à medida para mim. Especialmente habituado ao peso da velha Cósmica, quando a agarrei pelo tubo fiquei surpreso como a levantei tão facilmente. Gostei logo do gracioso design do quadro e do esquema de cores, meia azul Bianchi, meia cor de burro quando foge. A tubulação Reynolds e forqueta Tange, a sua geometria, o acabamento, são exactamente aquilo que gosto numa bicicleta vintage randonneur: leve, ligeiramente relaxada, encaixe perfeito do corpo, lugged para racks e pára-lamas.. Os componentes eram basicamente os que foram transplantados da Cósmica, excepção feita ao espigão do selim e ao eixo pedaleiro. Acrescentados depois os pára-lamas, saiu do estaleiro uma muito sólida e versátil bicicleta.

Primeiro numa curta voltinha pelo paralelo urbano e após montá-la por várias horas, numa longa pedalada estrada fora com algum sobe e desce, fiquei feliz por descobrir que me encaixava bem e nela me sentia confortável. Em suma, tinha nas mãos uma bicicleta polivalente, tanto para os meus propósitos diários como para longas distâncias. E por falar em longas distâncias, um dos pontos altos nesta bicicleta foi repetir a Flèche Randonneur. Depois de 24 horas e quase 400 km em cima dela, de chegar ao destino fresquinho como uma alface, esse foi o verdadeiro teste e a confirmação que tinha comigo o veículo perfeito para estas aventuras.

Numa das matinais pedaladas pelo Douro, três distintos desconhecidos nas suas modernas biclas de plástico carbono estavam surpreendidos com a minha velocidade. Depois de me acompanharem por alguns minutos, um deles olhou para a minha bicicleta e me perguntou: “Essa coisa é feita de aço!?” Satisfeita a curiosidade, mantiveram-se comigo durante algum tempo e, um a um, faziam par para melhor a admirar e gabar. Elogios do seu design elegante, do sotaque clássico de uma bicicleta à moda antiga, com os shifters montados no tubo do quadro, dos detalhes metálicos, dos cromados, já se tornaram banais sempre que sou engolido por pelotões carbónicos, de sorrisos estranhos e olhares intrigados.

Dada a minha propensão para bicicletas clássicas de aço, com a estrutura lugged vintage que apela à minha estética pessoal, achei que seria moderno o suficiente ceder à proposta do Vítor e embelezar a Tripas com um bom sistema de iluminação. Com isso, não só teria de se refazer a roda frontal como ficariam fios pendurados no quadro. Em algum lugar ao longo do caminho perdi a cabeça, e alguns euros, mas fiquei rendido. Com o cubo SP Dynamo raiado em aros MAVIC, farol IQ-X da Busch & Müller à frente e LED traseiro montados, o conjunto funciona na perfeição. As luzes são surpreendentemente brilhantes, não só à noite mas também durante o dia. O meu caminho ficou iluminado, muito além do olhar, e dá cá uma independência…

Com mais de sete mil quilómetros registados no STRAVA, sem uma avaria, sem um furo, apenas um ligeiro e estúpido trambolhão, parece-me muito bom para o primeiro ano. Se esta é a minha bicicleta de sonho? Se é aquela que vai durar por uma geração ou mais? Para já, e pelo prazer que me tem dado, é uma história de sucesso que rapidamente me fez esquecer a sua vida anterior, do tempo em que vestia vermelho e cinza e tinha decalques Cosmos. Eu sei que eu já disse isto, eu adoro esta bicicleta. É perfeita em quase todas as situações, especialmente agora que se aproxima a época das chuvas e eu valorizo os seus atributos, mas eu cá não garanto que no futuro não volte a sucumbir à síndrome do N + 1!

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Sobre paulofski

Na bicicleta. Aquilo que hoje é a minha realidade e um benefício extraordinário, eu só aprendi aos 6 anos, para deixar aos 18 e voltar a ela para me aventurar aos 40. Aos poucos fui conquistando a afeição das amigas do ambiente e o resto, bem, o resto é paisagem e absorver todo o prazer que as minhas bicicletas me têm proporcionado.
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3 respostas a um ano a fazer parar o trânsito

  1. Nelson Branco diz:

    E para comemorar, nada melhor que uma voltinha… venham muitos anos… sem acidentes ou furos!

    Liked by 1 person

  2. paulofski diz:

    sem bolo nem champanhe, mas teve direito a festa numa voltinha pela manhã a dentro

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  3. Pingback: a segunda pele de dona Tripas | na bicicleta

apenas pedalar ao nosso ritmo.

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