Vou de regresso a casa e paro para desfrutar desta vista agradável. Sorvo da minha garrafa de água e procuro me refrescar um pouco. O dia está a findar, a brisa é leve mas os níveis do mercúrio continuam bem acima do costume para a estação do ano. O tempo quente e o sol inclemente que me acossa, acompanha o destino da centenária ponte que está ali, silênciosa, bem à minha frente.
Foi em 1877 que o primeiro comboio por ali passou. Se puxar pela imaginação, o eco da sua passagem faria agora ricochete no betão da ponte de São João, que lhe faz companhia vai para mais de um quarto de século. Nessa época, Eiffel ainda não tinha erguido a sua torre, que só assomaria os telhados de Paris 12 anos depois. A Torre Eiffel é o símbolo de uma cidade, de um país, um dos monumentos mais procurados do mundo, uma fonte gigantesca de receitas e um guia inabalável para atrair turistas.
A nossa Dona Maria, estrutura de uma extraordinária leveza, é inexplicavelmente um monumento esquecido, empecilho dispendioso segundo os que nos governam, e mesmo a sua fama, granjeada à custa da sua idade, elegância, e sobretudo da assinatura de quem a concebeu, é-lhe tantas vezes roubada em detrimento da ponte Luíz I, de Teófilo Seyrig.
O Porto Oriental é muitas vezes assim. Esquecido, incompreendido, injustamente desvalorizado. Temos ali uma estrutura valiosíssima, com a assinatura de um nome de importância mundial da arquitectura do ferro, e, por aqui, nem serve de atracção turística. Permanece hirta, exposta ao tempo e aos cliques dos turistas que de barco cruzam sob o seu belo arco metálico. Não tem serventia para nada, nem de apoio à circulação, nem ao serviço das suas cidades. Se não é possível outra adaptação, ferroviária ou rodoviária, porque não fazer dela uma via de circulação pedonal e de bicicletas?