… agradável, enquanto dormia o sono dos justos, numa destas noites eu tive um daqueles sonhos que, evidentemente, nunca se tornarão realidade. Sonhei que bem lá num futuro mais que perfeito, os automóveis estariam extintos pela escassez de hidrocarbonetos e a superfície da terra só seria calcada por rodas de bicicletas. Alguns carros, autocarros e camiões ficariam expostos em museus como relíquias do passado, memórias de um tempo carbonizado pelos óxidos e nós, de rabos sentados nos selins, com pés nos pedais e mãos no guiador, pedalaríamos felizes para sempre. Estão a pensar que estou a delirar, pois estou. É inegável a minha simpatia pelas bicicletas, máquina desengonçada que se estiver parada destrambelha-se no chão como um albatroz em terra, mas que ao impulso dos pedais se projecta esguia, veloz e silenciosa. É uma máquina do tempo, que está ali, pronta para quem quiser levantar-se mais cedo e experimentar a liberdade. Só quem faz, ou já o fez um dia, conhece a boa sensação de acordar antes do sol numa manhã de domingo, comer bem, vestir-se, calibrar os pneus da bicicleta e sair para umas longas pedaladas, respirar aquele ar tão puro e fino antes das emanações poluentes dos veículos motorizados cujos donos aquela hora provavelmente ainda dormem, de ressaca, preguiça, cansaço ou tédio. É um silêncio diferente, que só as manhãs de domingo têm, por as ruas se encontrarem quase vazias, num efeito de viajem ao passado, no espaço de uma época ou lugar onde não se vê a loucura, gritaria, individualismo e desrespeito. Acreditem sinceramente, não é só por isso tudo que tive esse sonho, mas pelo conveniente pretexto da bicicleta ser amiga do meio ambiente, de me proporcionar saúde e bem estar físico, pelo poder de me transportar em curtos espaços de tempo, a pequenos recantos de um paraíso que de outra forma não os teria desvendado. E o paraíso em questão não é só o lugar que encanta após umas curvas ou pelo subida ao cume de uma montanha, é a sensação única de a ter conquistado, com o próprio suor.
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