Não sou muito entendido nas relações humanas mas desde que recomecei a pedalar e a frequentar o mundo das bicicletas percebi que os seus utilizadores, embora focados na mesma prática de dar ao pedal, detêm algumas características e comportamentos muito distintos uns dos outros. Antes de optar definitivamente pela bicicleta como meio de transporte, o ciclismo era basicamente para mim um desafio, uma diversão, uma prática desportiva. Pelo menos nas minhas pedaladas, a solo ou em companhia, percebi que quem pedala estrada fora tem uma espécie de conduta, de auxílio e partilha invulgares. Na estrada nunca encontrei uma comunidade tão unida e receptiva quanto a dos ciclistas. Na viagem, os guerreiros do asfalto, os aventureiros de todo o terreno, a malta chique e fixe, toda a massa crítica troca cromos a respeito das biclas, das experiências, rotas, sucessos, dicas, lugares porreiros onde pedalar, e por aí fora. Não se economiza na informação e cada um retira só coisas boas das pedaladas. Por exemplo, quando ciclistas, velocipedistas chamemos-lhes assim, se encontram a fazer um passeio todos parecem ser amigos de infância, quando na realidade muitos deles estão a conhecer-se naquele preciso momento.
Nunca fiz parte exclusiva de um grupo. Gozo do prazer de pedalar sem a necessidade de fazer parte de uma só tribo. No mundo das bicicletas uma característica interessante que me atrai de sobremaneira é que não existe distinção entre nós. Um velocipedista que tenha uma bicla rasca pedala ao lado de outros com verdadeiras máquinas. O gosto pelo pedal é o ponto em comum. O resto não tem tanta importância, por isso e em toda a circunstância, qualquer pessoa que pedale ao meu lado é bem recebido e ateia ainda mais a minha paixão pelo velocipedismo. A única diferença que existe dá-se na diferença de andamentos mas nisso sou eu que terei de me ajustar, porque simplesmente pedalar é quanto me basta.
Na bicicleta, e não importa qual, considero-me um privilegiado, pois tenho obtido alegrias e bons momentos com a prática da velocipedia… ok, do ciclismo! E em nenhuma outra prática, me arrisco a dizer que em nenhuma outra área da minha vida, fiz tantas amizades e encontrei tanta gente porreira de bem com a vida. Independentemente de qual tribo possa estar a fazer parte em determinado momento, todos os que pedalam, ou pelo menos todos os que conheci que pedalam, e são bastantes, têm em comum o senso prático, a simplicidade, o gosto pela liberdade, o respeito e a defesa pelo meio ambiente, a solidariedade, a amizade e certamente uma profunda paixão pela bicicleta. Na bicicleta sinto-me bem porque estou em constante movimento, com naturalidade e bom humor.