A vitrina não teria atraído a sua atenção não fosse aquela pose sensual, volúpia tão extravagante que lhe fez cintilar os olhos. Delgadas e ágeis curvas hipnotizaram e enovelaram o seu sonho. Uma faixa solar incidia reluzente naquele quadro misterioso a preto e branco e nos adornos de metal. O quadril num ângulo perfeito para a propagação dos braços. Formas deslumbrantes, configuração irrepreensível e tentadora para tão exultante paladino nela montar. Ávido e confortavelmente nela cavalgar.
Enquanto olhava para ela, via um menino de não mais de quinze, dezasseis anos de idade, querendo algo que poucas crianças querem hoje. Esse menino estava fora de si, de tanto nervosismo, como se tivesse chegado o momento há muito desejado. O seu rosto tinha uma determinação única para os muito jovens que têm uma vida aparentemente infinita à sua frente. Era uma expressão de insegurança e imensas dúvidas, mas com um grande desejo por realizar. Demonstrar que afinal se está perante uma daquelas coisas que quando se aprende nunca mais se esquece. Um feito, que o fará sentir-se adulto.
Num primeiro momento, parecia grande demais para ele. Mesmo assim subiu, encaixou-se e sentiu-lhe os contornos. A partir daquele dia iria granjear um certo estilo, o iriam ver numa nova postura. Em andamento, para cima e para baixo. Por enquanto não muito rápido, mas gradualmente com um ritmo constante. De vez em quando abrandava para recuperar o fôlego para poucos segundos depois estar pronto a tentar novamente, de um lado para o outro, e manter a bicicleta em posição vertical. Vigorosamente, empurrando com a perna esquerda, balançando para a direita, certo que não iria cair.
A alguns minutos de distância parou, colocando um pé, e depois o outro, no chão. Um olhar de vitória ia então surgindo nos seus olhos, acompanhado de um sorriso orgulhoso que se espalhava por todo o rosto. Empoleirado na sua bicicleta com seu pé esquerdo de novo no pedal, vira a cabeça da forma mais indiferente. O seu olhar estava fixo na distância. Concentra-se no equilíbrio para aumentar a velocidade. Acelera ainda mais o ritmo, esmaga os sapatos nos pedais, sentindo forças suficientes para arriscar a adição de um pouco de velocidade. A roda da frente desliza, controlada, libertando toda a energia da perna grossa, tensa, tanto quanto podia. Ele andava com confiança, sem o menor medo de vacilar. Iniciava agora uma nova viagem. Com o mesmo olhar de menino, olhava para a estrada pronto para recomeçar. Estava finalmente em transição, de bicicleta de um menino para uma bicicleta de verdade, para uma bicicleta “à homem”.
(faz hoje 3 anos que esta devoradora de quilómetros me fortalece as emoções!)
Pingback: e anti-furo… até ver! | na bicicleta
Pingback: isso, ou pelo simples prazer de pedalar | na bicicleta
Pingback: reviver Fânzeres de bicicleta | na bicicleta
Pingback: gOrka, made by iNBiCLA | na bicicleta