
Relegado para o lado mais à direita da rua, empoleirado em tubos de geometria elementar, impulsiono-me através do espaço, zunindo entre veículos, balançando nas curvas. Os fumos da combustão sobem através da atmosfera, escapo-lhes e encho as narinas com o cheiro da urbanidade. Noção e percepção, imagem, som, olhos e ouvidos bem abertos que me permitam antecipar, traçar graciosos movimentos, deslizando através da constrição urbana. Que prazer deixar para trás os carros alinhados, convencidos, enxames de ferocidade num fogo sem chama.
Por um lado, lado a lado, sob um sol escaldante de verão, pele bronzeada, suada por todos os poros, conspurcada de adrenalina, pedalo para bem longe. Uma garrafa meio vazia que se partilha e mata a sede. Em outras ocasiões, com dedos dormentes de frio, músculos tensos, nariz avermelhado, aquecido sob camadas de roupa, surge uma nuvem espessa. A chuva que me escorre pela cara e me mata a sede. O meu movimento intensifica a brisa que me sopra no rosto. A cada pedalada um sussurro no vento. Respiro a aura matinal, fria e húmida, exalo, transpiro, inspiro profundamente o proveito da velocidade.

Através da minha leveza, sinto o peso das massas de metal ao meu redor, cada mudança, cada reacção. O feitiço da estrada superando dificuldades, os declives, o espaço aberto. O equilíbrio do corpo, acção e prática que exerce um efeito calmante à mente. Parado num semáforo, permaneço, pé esquerdo preso no pedal, pé direito firme em terra firme. Muito em breve, a luz fica verde e eu empurro o pedal mais alto com a força do peso do meu corpo. Na minha bicicleta, universo microcósmico, sou potência e explosão, dono do meu próprio caminho, senhor do meu destino.




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