Talvez por não haver muita gente na rua ao nascer do sol de um Domingo, é daqueles instantes em que dá mais gozo pedalar. Um momento místico, se assim se pode dizer, no ritmo das pedaladas, no frio que vai desaparecendo do corpo e da realidade, do dia que vai ganhando contornos luminosos, acordando a cidade e transformando-a num cenário provável. O sol desponta no horizonte, no rio e dá-nos os bons dias, iguais a tantos outros. As padarias começam a expelir os primeiros aromas da manhã, da mesma forma que os pássaros parecem nos cumprimentar. A estrada, como tantas outras coisas, surge sempre com sacrifício. Contudo, no sacrifício também há o prazer de pedalar.
O Homem-máquina, metade combinação complexa de articulações e músculos, a outra é uma bicicleta. Uma delas é infinitamente ajustável e adaptável, o outro é um ciclista. O ideal é uma união perfeita entre as duas entidades separadas, actuando em harmonia e vontade, excepto a realidade geralmente desigual, que envolve joelhos sólidos, costas doridas e ombros queixosos.
É que para contradizer a ordem natural das coisas, num desvio imprevisto e um atalho mal calculado, um pequeno trambolhão deixou-me um tanto ou quanto combalido. Deve ter sido da falta de café! Do resto, o mesmo percurso, o mesmo destino e o pneu furado da praxe. Metaforizando a razão deste blogue, todos os caminhos que elegemos percorrer somos nós que escolhemos. A opção é certa, a dúvida é capciosa.
Ao longo da estrada, em muitos locais por onde passamos, muita bicicleta, representando a independência, a liberdade e um modo de vida. Sofrendo com o encontro da subida, empurrando a bicicleta ao longo da vida, treme-lhes a mão a cada sensação e constante movimento. Ouço os sons das pessoas a interagirem com as máquinas como sons de urgência, transpirando a terra endurecida e conhecida como o tempo. Do nada, um motor rosna, tenso, ameaçador à distância. Nada lhes impede o progresso, apenas a firme e perfeita intenção de manter uma linha recta. Tal como nós.
A objectiva do meu telemóvel não é grande coisa, e mesmo a ter de segurar um guiador e pedalar não consegui resistir a tirar fotos do que fui vendo enquanto faziamos mais um passeio audacioso até Fátima.
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