Nem sempre posso prever o que vai me inspirar a escrita, um texto, uma situação que mereça ser contada e publicada. Alguma coisa que me lembre uma passagem, talvez da infância, talvez de um outro momento qualquer. Basta um objecto, uma cena testemunhada, especialmente nesse momento que tenho a companhia oportuna da minha bicicleta. Imagino que já deram conta disso! Entre cenas do quotidiano que me chamam a atenção, um pouco ao acaso, naquele momento em que ia ao Monte da Luz e a pé subia a Rua do Farol, detenho-me por alguns instantes a olhar para uma velha bicicleta coberta de ferrugem. Abandonada ou simplesmente estacionada, aquela antiga bicicleta carcomida pelo tempo provoca-me um certo fascínio. Não está presa a nada, apenas deixada ali, no passeio, encostada à parede sombria. Não tive como não deixar de associar aquela velha pasteleira à vasta serventia que com o seu dono, ou donos, se viu envolvida. Parecia ter sido agora deixada ali, naquele lugar, como um objecto decorativo, uma função diferente tornando-a visível, retirando-a do esquecimento. Quem sabe, se à espera de uma nova vida! Quem sabe… O registo fotográfico tem, então, a função inspiradora, a imagem como elo de ligação ao contexto, a motivação para este texto. Aponto-lhe a micro-objectiva do telemóvel, periclitante, como se estivesse a invadir a sua privacidade. Não havia ainda recebido o aviso sonoro da focagem quando sinto perto de mim uma presença humana, que me observa. Na porta da loja, mesmo ao lado, está um velhote, curioso naquilo que estou a fazer. Talvez fosse o dono daquele monte de ferrugem, não sei, e senti-me na obrigação de pedir permissão para tirar o retrato. “Ahh… esteja à vontade!” Então, com licença…















