Hoje em dia é difícil encontrar crianças sozinhas nas ruas, indo a pé ou de bicicleta para a escola. Tanto no Brasil quanto em Portugal o meio de transporte mais usado para levar os filhos à escola é o automóvel.
Mas o que aconteceu? Houve sem dúvida uma mudança1 de 20 anos para cá. Antigamente as crianças iam para escola a pé ou de bicicleta, junto com o vizinho ou o amigo. Buscar e levar o filho de carro para a escola era coisa “de rico” ou de quem morava muito longe. A insegurança rodoviária e o medo que os pais têm de deixar uma criança sozinha foram os principais fatores para essa mudança.
A questão do medo é válida. Hoje em dia proliferam histórias de pedófilos. Num país desigual como o Brasil onde muitos se sentem inseguros mesmo dentro de casa, deixar uma criança sozinha pode ser considerado um ato de loucura. É importante mudar isso, percebendo verdadeiramente até que ponto é realmente inseguro e até que ponto é fantasia.
Já a insegurança rodoviária é um verdadeiro paradigma, um contrassenso. Pergunte para uma mãe porque ela não deixa o filho (mais crescido claro, não vamos falar aqui de bebês) ir para escola a pé ou de bicicleta, acompanhado de um amigo ou mesmo acompanhado por ela. Ela vai dizer que é muito perigoso, os carros são muito rápidos e não respeitam os pedestres/peões, logo a única solução segura é ir de carro. Como diz na foto abaixo: “Há muito tráfego para o Billy ir a pé para a escola; portanto nós o levamos de carro.”

Figura 1- Tráfego induzindo tráfego. Fonte: http://www.planetizen.com/node/56017
A única solução segura encontrada pela mãe, que se preocupa com a segurança do seu filho, alimenta o problema. Um ciclo vicioso no qual estamos presos e que é preciso muita coragem para lutar contra, pois estamos a falar no bem mais precioso de uma família, os filhos. Infelizmente os pais se esquecem que estão preservando a segurança presente da criança mas comprometendo o seu futuro e o de outras pessoas, através da poluição e dos demais custos inerentes a essa solução. E para agravar esse problema e condicionar os pais ainda mais a esta escolha temos a questão das distâncias. A noção de “escola de bairro” está a desaparecer. Com o mundo competitivo que temos hoje, onde cada vez mais e mais cedo se exige excelência das crianças, os pais não se importam em colocar o filho para estudar numa instituição 10, 20 km de distância, pois estão a buscar o melhor para seus filhos.
E o ápice desse contrassenso são os carros tipo SUVs. Estes carros são comprovadamente os que mais ameaçam a segurança de uma criança que atravessa a rua, pois devido à posição elevada do motorista e à baixa estatura da criança o motorista simplesmente não vê a criança que atravessa na sua frente. Ou seja, uma mãe decide comprar um SUV para levar o filho com segurança para a escola mas esquece que está a ameaçar as demais crianças que vão para esta mesma escola.
É estranho, no mundo cheio de soluções que vivemos, as famílias se restringirem somente ao automóvel como solução única de mobilidade, quando existem tantas outras opções. Ao mesmo tempo que confiamos cegamente no automóvel como solução ótima, nos tornamos reféns dele. Quem nunca ficou “na mão” de manhã no caminho para o trabalho? Com o carro quebrado ou o pneu furado? Ao invés de ser uma solução o automóvel se torna um problema.
Há ainda uma outra questão. A relação entre a saúde das crianças (e dos adultos também), os transportes e a distribuição espacial da cidade. Fugindo do foco já batido da poluição, até que ponto nossas opções de mobilidade e de localização afetam o nosso nível de atividade física, nosso peso e nossa saúde. Um tema para outro texto.
Para finalizar deixo aqui dois exemplos interessantes: O “Walking Bus2”, uma solução presente na Austrália e Reino Unido, e o “Bicycle Bus3”, uma solução holandesa.
Referências:
1 http://www.saferoutesinfo.org/sites/default/files/resources/NHTS_school_travel_report_2011_0.pdf (apesar de retratar a realidade americana acredito que é válido)
2 http://atitudesustentavel.com.br/blog/2012/03/08/indo-a-pe-para-a-escola/
3 http://atitudesustentavel.com.br/blog/2012/02/14/bicycle-school-bus-leva-criancas-para-a-escola/
Só para dizer que em Lisboa em POUQUISSIMOS lugares existe um EXCELENTE exemplo, o PEDIBUS. http://www.cm-lisboa.pt/viver/mobilidade/seguranca-rodoviaria/pedibus . Parece-me ser uma coisa idêntica ao walking bus que fala 🙂 Temos que dar a conhecer essas opções, e trazer mais gente para elas. Expandir!
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Com certeza! É preciso expandir esses bons exemplos! Nas escolas, colégios, juntas de freguesia, bairros e associação de moradores. Acredito cada vez mais que iniciativas bottom-up (de cima para baixo) são as que melhor funcionam para problemas locais.
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ops, erro meu! bottom-up: de baixo para cima!
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Republicou isso em Matemática em Sobral.
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